O que tem a ver, em termos de vinhos, o Jura francês e o Uruguai? pode não ser muito, mas também não precisamos procurar por muitos motivos para promover degustações de vinhos! assim que, em 13 de dezembro de 2012, o confrade Jorge Ducati promoveu, para quatorze associados, uma memorável degustação, em dois momentos, de vinhos do Jura (trazidos por êle da região) e do Uruguai (idem).
A primeira parte foi acompanhada por um prato de frutas secas, brie e gorgonzola, preparado pela Jandyra, em busca das melhores harmonizações com os vinhos peculiares jurassianos, descritos abaixo; a segunda parte foi com uma excelente picanha ao forno, preparada pela Cris e pelo Celso.
O texto distribuído é reproduzido abaixo:
Por que Jura e Uruguai? porque vinhos do Jura são raros, e no Brasil, caros. Os que foram trazidos da França para hoje, vieram em pequena quantidade. Por isto, a degustação foi dividida em duas partes: inicialmente, uma percepção de um pequeno aspecto da diversidade e originalidade dos vinhos do Jura francês, e após, um percurso pela florescente paisagem dos vinhos uruguaios.
Jura
A região do Jura francês fica ao longo da fronteira com a Suíça, na região de Franche-Comté. A população total é de 260.000 habitantes, numa área de 5.000 km2. Não há grandes cidades, e a produção de vinhos é pequena; antes da filoxera, havia muito mais videiras. As castas utilizadas, na maioria, são locais: para as tintas, a trousseau e a poulsard; para as brancas, a savagnin. Também são autorizadas a chardonnay e a pinot noir. A viticultura ocorre em altitudes moderadas, em uma verdejante região pré-alpina onde os invernos são com muita neve.>P>
As “appellations” do Jura são: para vinhos tranquilos, Côtes du Jura, Étoile, Arbois, e Château Chalon; para espumantes, a Crémant du Jura; e para destilados, a Macvin du Jura. Os vinhos tintos, das castas Trousseau, Poulsard, e Pinot Noir, tendem a ser mais ácidos e com pouca cor, tanto em consequência da natureza das castas, quanto em função das condições climáticas. Assim, para muitos amadores da tipicidade aliada a um vinho mais equilibrado, os vinhos de Savagnin têm um interêsse especial (sem demérito dos muito típicos vinhos das outras castas mencionadas).
A uva Savagnin, com 300 hectares, representa 15% das vides jurassianas (jurássicas é outra coisa). Sua origem é incerta, mas se aproxima do Klevner de Heiligenstein, da Alsácia, e pertence ao grupo das Traminer. A palavra é próxima de “sauvage” (selvagem), uma indicação de que é vinha autóctone, desenvolvida a partir de vinhas selvagens locais; foi aclimatada pelos monges (ou monjas) de Château Chalon, pelo século XIII. É uva de vindima tardia, de cor de bronze, quando bem madura.
Além de vinhos brancos convencionais, também são produzidos, a partir da uva Savagnin, os “vins jaunes” (vinhos amarelos), nas quatro denominações para vinhos tranquilos (Château-Chalon AOC, Arbois Vin Jaune AOC, Cotes du Jura vin Jaune AOC, e Vin Jaune de L’Etoile). Neste caso, a colheita é muito tardia, mesmo após as primeiras geadas. As uvas são muito maduras e com muita concentração. Após a fermentação, o vinho repousa em barricas de carvalho durante, pelo menos, seis anos e três meses, sem nenhuma intervenção; ou seja, o vinho evaporado não é reposto (não há « ouillage » nem « soutirage »). Durante este envelhecimento, o vinho se cobre de um véu espesso, semelhante à « flor » do xérez. Normalmente, este processo dá lugar a vinhos estragados, mas aqui, ocorre uma oxidação singular, e nascem os « vins jaunes », sãos, únicos, de cor dourada, luminosos, e sabor potente.
O Château Chalon é um « vin jaune » especial, elaborado no entorno do village de mesmo nome. É um dos grandes vinhos da França, sempre engarrafado nos « clavelin », garrafas de 620 ml, únicas na Europa e com autorização especial, e que representam, conta a lenda, o que resta de um litro, após 75 meses de envelhecimento em barrica. O tempo de guarda dos vins jaunes, e em especial do Château Chalon, é desconhecido, pois exemplares de 200 anos estão bons para degustar. Há um comércio ativo de garrafas antigas, de 100 anos ou mais. A durabilidade é compreensível, pois os vinhos desde o engarrafamento já estão oxidados, assim que após não se passa mais muita coisa. É claro que vinhos oxidados têm gosto diferente, e então há amadores, e há quem deteste. De qualquer modo, os vins jaunes são vinhos sãos, e certamente, gastronômicos. Seus preços não são baixos.
O « vin de paille » (vinho de palha) é ainda mais especial e raro. Provém de uvas passificadas na planta, que são colocadas em esteiras de palha para secar por mais três meses. É um vinho licoroso, em geral oxidado. A produção é pequena e as garrafas são de 375 ml.
Vinhos servidos :
1. Domaine de Montbourgeau, Étoile 2008 Savagnin, 13°, 17,50 euros
Vinho branco seco de vinificação convencional. O nome Étoile (estrela) vem do fato de que o village, de nome Étoile, está rodeado de cinco colinas, formando os braços de uma estrela, e também porque o solo das vinhas contém estrelas do mar fósseis, as pentacrinas.
2. Houillon-Overnoy, Arbois Pupillin 2000 – Savagnin oxydatif, 500 ml, 13,5°, 60 euros.
Vinho natural, certificado biológico, elaborado pelo casal Emmanuel e Anne Houillon, os quais continuam o trabalho iniciado nos anos 60 por Pierre Overnoy, mítico viticultor da região de Arbois, no village Pupillin. Pierre ainda está presente e ativo, e é pioneiro da retomada regional em prol de uma viticultura natural. Os vinhos não contém enxôfre (como os de Thierry Allemand em Cornas) e são extremamente prestigiados e procurados.
3. Domaine Jean Bourdy, Château Chalon 2004, 620ml, 40 euros.
No village de Arlay, próximo a Arbois, a família Bourdy está na viticultura desde o século XV. De fato, as caves e prédios são muito antigos, e nos porões há uma coleção de garrafas dos séculos XVIII (1781) e XIX, disponíveis para o comércio.
4. Domaine Rolet Père et Fils, Arbois vin de paille 2003 (Poulsard 20%; Chardonnay 40%; Savagnin 40%), 375 ml, 16°, 23 euros.
Foram vinhos incríveis. o Étoile é muito peculiar, muito seco, único, ou seja, não se parece com nenhum outro vinho; aromas que se desenvolvem, muito bom. O Pupillin, a partir de uma primeira sensação de vinho fechadíssimo, seco, âpre, abriu-se aos poucos, revelando aromas de mel e de frutas secas. O Château Chalon é de fato um grande vinho, que na verdade, necessita de horas de aeração (talvez não de oxigenação…); e o vin de paille revelou-se como vinho de aperitivo e de sobremesa, doce sem excesso, maravilhoso.
Uruguai
Vinhos servidos:
1. Pisano, Arretxea Lyrios, Viognier 2004 (Progreso) 13°, R$ 50,00
2. Pisano, Arretxea, Cabernet Sauvignon, Merlot e Tannat 2006 (Progreso), 14°, R$ 50,00
3. Alto de la Ballena, Merlot 2006 (Maldonado), 14°, R$ 60,00
4. Alto de la Ballena, Tannat-Viognier 2008 (Maldonado), 14°, R$ 70,00
5. H. Stagnari, Dinastia 2004 (La Caballada, Salto), 15°, R$ 60,0
6. Gimenez Mendez, LYM 2006 Tannat-Tannat (Las Brujas, Canelones), 14°, R$ 35,00
Dentre os uruguaios, o Dinastia foi julgado o melhor, e também ganharam votos o Merlot e o LYM; mas todos vinhos estavam bons, inclusive o Viognier 2004, denso e seco.
Como espumante de boas-vindas, foi servido um excelente Joaquim rosé, provando que a Villa Francioni não se limita aos seus ótimos tintos e brancos (e rosés).