Dentre as infinitas nuances do Mundo do Vinho, uma das mais intrigantes é a que atribui qualificativos de gênero a certos vinhos. Mais concretamente, na literatura podemos encontrar que alguns vinhos são masculinos, e outros femininos. Se tais sutilezas são reais e verificáveis é uma questão a investigar; poucos vinhos são objeto destes qualificativos, e portanto, uma verificação é muito difícil de ocorrer. Vinhos raros e especiais da Borgonha, de Bordeaux e de algumas poucas outras região são ocasionalmente assim qualificados. Um grupo de apreciadores de Porto Alegre, a Miniconfraria, que existe desde 1998 e que data dos tempos da saudosa Professora Isolda Paes, efetuou um teste em 12 de dezembro de 2017. Na ocasião, foi distribuído um texto que reproduzimos a seguir.

“Define-se um vinho como feminino quando ele é mais fino, delicado, elegante, sutil, redondo, macio e mais fácil de beber. Um vinho considerado masculino será potente, encorpado, tânico, mais estruturado.” (lasommeliere.com)
De um ponto de vista mais geral, na França, e para quem leva a sério esta distinção, os vinhos de Bordeaux são masculinos e os da Borgonha, femininos. Há distinções mais sutis. Em Bordeaux, os de Margaux seriam mais femininos e os de Saint-Estèphe mais masculinos.
Na Borgonha, os Chambolle-Musigny são considerados femininos, enquanto os Gevrey Chambertin e os Pommard têm reputação de serem vinhos masculinos. Pode-se gostar de vinhos masculinos ou femininos independentemente do apreciador ser homem ou mulher.
Na Universidade de Dijon, uma série de degustações às cegas não produziu resultados conclusivos; no entanto, os vinhos degustados eram jovens, ainda não plenamente expressos.

Na Borgonha, alguns vinhos têm recebido estes atributos:
Chambolle-Musigny: Estes vinhos tintos são delicados, elegantes, com um aroma exaltante, com um charme ao mesmo tempo frágil e resoluto dos vinhos finos em renda. Têm uma delicadeza feminina, uma graça sedutora e um bouquet cativante verdadeiramente caloroso.
Gevrey-Chambertin: Seus vinhos revelam grandes equilíbrios entre a potência e a fineza, podendo ser classificados como masculinos. Acompanham bem as caças. Menos ácidos, mas tânicos e com notas animais de almíscar.
Pommard: Sabores longamente dominados pela adstringência, realçados por uma acidez marcante e uma doçura que só aparece nos vinhos maduros. Sólidos e tânicos, acompanham as caças.

Para um grupo de quatorze degustadores foram distribuídos às cegas cinco vinhos, devendo os presentes assinalar em uma tabela, para cada vinho, sua impressão sobre “masculino” ou “feminino”. Os vinhos foram os seguintes:

1. Groffier Père et Fils, Chambolle-Musigny Premier Cru “Les Amoureuses” 1992.
2. Giraud, Chateau de Pommard 2010.
3. Domaine Denis Mortet, Gevrey-Chambertin Premier Cru “Les Champeaux” 2002.
4. Domaine Marchand-Grillot, Gevrey-Chambertin “En Créot” 2010.
5. Joseph Drouhin, Chambolle-Musigny Premier Cru 2008.

Como se pode verificar pela relação, procurou-se apresentar vinhos mais evoluídos e também vinhos mais jovens, para evidenciar tanto a plena expressão derivada do tempo como o frescor .
A temperatura dos vinhos estava correta e foi dado amplo tempo para que, durante a degustação, os vinhos se aerassem. Os acompanhamentos foram somente de pão e água. Após a degustação foram computados os resultados.
Sendo quatorze degustadores e cinco vinhos, o total de opiniões foi de setenta. Destas opiniões, trinta e uma foram corretas, ou seja, o resultado próximo a 50% de acertos não indicou uma tendência estatisticamente significativa.
Pode-se argumentar que a sensibilidade para uma identificação neste tipo de vinho é algo que só pode existir dentro de um grupo de conhecedores contumazes, ou seja, e neste caso, para um grupo de especialistas em vinhos da Borgonha de alto nível. É bem possível. Temos então um estímulo para perseverar no estudo dos vinhos da Borgonha, tarefa com alto nível de prazer.