A reunião das Quintas de 24 de outubro de 2019 foi organizada pelo confrade Jorge Ducati, para oito associados. Na ocasião, foi distribuído o seguinte texto:
A noção de safra boa ou ruim, em particular na viticultura, está associada à variabilidade climática de uma determinada região. Em regiões de clima mais estável, e portanto mais previsível, como em áreas do Chile e Argentina, há épocas de chuvas e épocas mais secas; nestes dois casos a época seca coincide com a época de maturação das uvas, e tudo fica mais fácil para a viticultura. Não há grande diferença entre as safras sucessivas. Há um caso inverso, no Sudeste do Brasil, onde a época seca coincide com o inverno; neste caso, a viticultura (como na Serra da Mantiqueira) adota a inversão de ciclo, para ter uvas fora do período de chuvas.
Mas em Bordeaux, na Borgonha, e no Rio Grande do Sul não é assim. Há verões secos e verões muito chuvosos, e a qualidade das uvas varia em função disto. Há safras boas e safras ruins, chegando-se a extremos. No Rio Grande do Sul, safras historicamente memoráveis foram 1991, 1999, 2005, 2012 e 2018. E safras para esquecer foram 2003 e 2010. Note-se que em outras atividades agrícolas a percepção é contrária. Anos ruins para a viticultura são ótimos para soja e milho.
Em algumas regiões de viticultura muito antiga existe a noção, não unânime, de que os grandes vinhos, mesmo sendo de anos ruins, sempre acabam por encontrar um equilíbrio e uma grande qualidade, dados anos suficientes. Talvez no futuro esta tese possa ser testada nos vinhos gaúchos.
Para a degustação de hoje selecionamos por pares do mesmo produtor alguns vinhos gaúchos de safras boas e ruins. Tentando evitar um efeito de diferenciação devido à idade nos vinhos, procuramos vinhos de safras próximas, para que as diferenças sejam o mais possível apenas função da safra, ou seja, na maturação e sanidade da fruta, refletindo-se nos vinhos na concentração e cor, taninos, acidez e teor de álcool.
Os vinhos desta noite:
1. Brunello de Mariana 2010 (ano péssimo)
2. Brunello de Mariana 2012 (ano excelente)
3. Miolo, Quinta do Seival Castas Portuguesas 2011 (ano bom), 14°
4. Miolo, Quinta do Seival Castas Portuguesas 2013 (ano peculiar, muito quente), 13,5°
5. Barbera de Mariana 2010 (ano péssimo)
6. Barbera de Mariana 2011 (ano bom)
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A degustação teve dois momentos. Primeiramente foram servidos os quatro vinhos de Mariana Pimentel, na Serra do Sudeste (vinhedo de Jorge Ducati e Jandyra Fachel, vinificação por Vilmar Bettú). Em um segundo momento foram servidos os dois vinhos da Miolo, da região da Campanha. O resultado da degustação foi extremamente interessante. Os vinhos 2010, ano ruim, e considerados pelos produtores como “casos perdidos” até alguns meses atrás, mostraram pouca cor e pouca concentração, com aromas iniciais de enxofre. Após alguns minuto, foi-se o enxofre e vieram aromas florais delicados. Ambos 2010 estavam delicados e agradáveis, vinhos leves. De fato, o tempo de vários anos foi benéfico. Os 2011 e 2012 estavam parecidos, se bem que o 2011 era mais escuro e mais ácido, como bom Barbera.
Os Miolo eram de outra categoria. Densos, encorpados. Outros vinhos, muito bons mas de forte contraste com a primeira bateria. Comparação chocante.
Como espumante de boas-vindas, tivemos um Cárdenas brut método champenoise 2017, oriundo de vinhedos da família Cárdenas em Mariana Pimentel e elaborado em Farroupilha. Muito bom, se bem que de preço um pouco alto (R$ 127,00)
Esta foi uma degustação composta integralmente de vinhos da Metade Sul. A Parte II deverá contemplar vinhos da Serra Gaúcha.